Direito Nosso

A sociedade civil e o novo direito associativo brasileiro 1/2

O Código Civil de 2002 diferenciou sociedade de associação, estabelecendo que sociedade é todo grupo de pessoas que objetivam com sua atuação o lucro financeiro como resultado final, e, interferiu na existência das até então denominadas “sociedades sem fins lucrativos”, que receberam o “nomen iuris”, ou seja, a classificação jurídica de associação, as quais são agrupamentos de pessoas com fins não econômicos.

Desta forma, o Estatuto Civil dá operabilidade ao novo direito associativo instituído na Constituição Federal de 1988, com a inserção das prerrogativas das associações entre as cláusulas pétreas no Artigo 5º, dos Direitos e Garantias Individuais e Coletivas.

Foram estabelecidas no Código Reale um conjunto de regras que atingem diretamente constituição legal das organizações associativas, sendo algumas substanciais, e todas as associações existentes, necessitam promover uma reforma estatutária, visando adaptar-se as novas regras legais contidas nos artigos 44 a 52, que são genéricas para todas as pessoas jurídicas de direito privado, e, sobretudo nos artigos 53 a 61, que são especificas para as Associações.

Surge uma oportunidade impar para as associações aproveitarem a obrigatoriedade imposta pelo Códex Civil, e atualizarem seu Estatuto Associativo, que deve ser “especifico para cada entidade”, e não “modelos pré-fabricados”, eis que cada organização possui uma cultura peculiar, devendo expressar a visão, a missão, os valores, as estratégias, e os objetivos institucionais, e esta deve estar espelhada em suas normas estatutárias, e em que pese a Lei de 1916, como a nova Lei de 2002, estabelecerem princípios gerais para a constituição jurídica da instituição, permanecem elas com o direito a auto-regulamentação, à luz questões que atinam diretamente ao grupo social organizado juridicamente, e evidentemente também atendidos os preceitos da Lei de Registros Públicos.

Entre outras questões, registramos que o Código de 2002 não recepcionou o § 2o do art. 20 do Código de 1916, no que tange as pessoas jurídicas de fato, por isso, enviamos a equipe do falecido deputado Ricardo Fiúza, Relator Geral do Código Civil, sugestão no sentido de que referido instituto fosse incorporado ao seu texto, o que inclusive foi acatado pelo relator, conforme consta na obra “O Novo Código Civil e as propostas de aperfeiçoamento”, escrito com a colaboração de Mário Luiz Delgado Régis, Saraiva, 2004.

Segundo sustentam alguns juristas, com os quais concordo, é incoerente a aplicação, mesmo, por analogia dos art. 986 a 990, CC, eis que eles se referem explicitamente ao “Direito Empresarial”, que não tem nada a ver, como o próprio legislador sabiamente diferenciou do ”Direito Associativo”, fonte das organizações não econômicas, como são as associações, e que por não implicar em maiores conseqüências ao texto legal, muito pelo contrário, ele será aprimorado ao recepcionar o dispositivo do Código de 1916, como percebeu, época, o digno relator ao acatar a sugestão enviada, incluindo-a entre as alterações aperfeiçoadoras, que serão efetuadas, mas ainda carecendo de consubstanciação pelo Congresso Nacional.

Destaque-se que o Código Civil é norma de ordem pública, consequentemente, seus dispositivos já estão em vigor desde 11 de janeiro de 2003 para todos os efeitos legais, o que significa dizer que a Organização Associativa que possui Estatuto contendo disposição contrária ao estabelecido na Lei 10.406/02, com as alterações da Lei 11.127/05, tem de aplicar o preceito vigente independente do que constar no Ato Constitutivo, bem como, é de se observar o disposto no art. 2.033, “… as modificações dos atos constitutivos das pessoas jurídicas (…), regem-se desde logo por este código.”.

Referida necessidade é extensiva para as Igrejas e Organizações Religiosas na medida em que seus estatutos foram concebidos na vigência do Código Civil de 1916, o qual foi revogado pelo Código Civil de 2002, sendo que para estas não existe prazo obrigatório, mas o quanto o fizerem estarem evitando expor seus associados eclesiásticos e diretores estatutários a riscos legais desnecessários, eis que o judiciário já tem se posicionado acerca da aplicabilidade da lei civil, como não poderia ser diferente, as Instituições de Fé. Continua …

Gilberto Garcia é Advogado, Pós-Graduado, Mestre em Direito. Professor Universitário e Conselheiro Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Rio de Janeiro (OAB/RJ). Consultor Jurídico Eclesiástico e Autor dos Livros: “O Novo Código Civil e as Igrejas” e “O Direito Nosso de Cada Dia”, e, Co-autor na Obra Coletiva: “Questões Controvertidas – Parte Geral Código Civil”, e, “Novo Direito Associativo”, Editora Método, e, DVD – Implicações Tributárias das Igrejas, Editora CPAD. Site: www.direitonosso.com.br