Nosso país já adotou o Estado Confessional no período do Brasil-Colônia, de 1500 a 1824, e no Brasil-Império, de 1824 a 1891, quando a religião católica era oficial, como é ainda hoje em lugares como na Argentina, ou na Inglaterra onde a religião Anglicana é oficial, e em países Islâmicos, os quais consideram a opção religiosa até para efeitos de cargos no serviço público, ou em Estados onde se vive o Ateísmo como ideologia oficial.
O princípio da Separação Igreja-Estado, vigente em nosso sistema constitucional desde 1891, e mantido na Carta Magna de 1988, que fundamenta o Estado Laico, ou seja, o Estado sem religião oficial é uma das maiores conquistas da humanidade, eis que este tipo de construção jurídica, que nosso país herdou da visão francesa, “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, é exatamente o meio termo, entre o Estado Ateu e o Estado Confessional.
No Estado Ateu impõe-se que a religião deve ser negada e perseguida pelos órgãos oficiais, numa visão unicamente materialista da vida, e com proibições para que os cidadãos possam expressar sua fé de forma pública, na perspectiva de que Deus é uma criação da mente humana e deve ser apagada das esferas sociais, sendo as pessoas incentivadas a buscar o relacionamento numa ótica tão somente humanística e existencial.
Já no Estado Confessional há uma espécie de confusão entre os órgãos da administração pública, os poderes executivo, legislativo e judiciário, que são as representações do Estado, e uma determinada religião, sendo esta a religião oficial, pelo que deve ser obrigatoriamente seguida por todos os cidadãos, sendo proibida a opção por qualquer manifestação espiritual que não seja aquela que é professada pelo Governo, para todos os efeitos legais.
Desta forma, o Estado Laico é o que proporciona o equilíbrio do exercício de fé entre os cidadãos, seja porque não persegue ou proíbe qualquer manifestação religiosa, seja porque não adota oficialmente através de seus órgãos representativos qualquer opção espiritual em detrimento das demais, ao contrário, com base na Constituição Federal de 1988 é dever do Estado proteger todas as confissões religiosas, inclusive cidadãos ateus e agnósticos.
Por isso, a conquista deste Estado Laico, em nível constitucional, apesar de todas as suas imperfeições, especialmente na manutenção dos diversos feriados religiosos, e ainda, na tolerância de símbolos místicos em prédios e repartições públicas, é um marco legal que não deve ser flexibilizado de forma alguma, exatamente porque ele é a garantia jurídica da convivência pacífica entre os religiosos brasileiros de todos os matizes de fé.
A Constituição Federal de 1988 é peremptória em seu, artigo 19, “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – Estabelecer cultos religiosos, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; […]”, e sobretudo no artigo 5º – Cláusula Pétrea -, incisos VI, VII e VIII.
Numa recente estada em Brasília/DF pude visitar a Sede da CNBB e lá ouvir de um representante que esta só se manifestará sobre o Acordo Jurídico após a ratificação do Congresso Nacional, à quem compete constitucionalmente transformar este “Protocolo de Intenções” em Tratado Internacional vigente em todo o país, concedendo ao Grupo Religioso, que sabidamente congrega a maioria da população brasileira, privilégios legais.
Este Acordo se aprovado pelo órgão que a Constituição em seu artigo art. 84, inciso VIII, concede poderes específicos para homologá-lo, anulará de forma definitiva o Princípio da Igualdade constitucional das religiões em nosso país, eis que todas as confissões de fé, independente do histórico, quantidade de seguidores, poderio econômico, tamanho do patrimônio etc, são igualadas pelas normas legais, e ameaça de forma objetiva o princípio constitucional da Separação Igreja-Estado, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Se o Congresso Nacional ratificar este Novo Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, restara tão somente as lideranças religiosas impetrar uma ADI – Ação Declaratória de Inconstitucionalidade do Acordo Jurídico junto ao Supremo Tribunal Federal, o qual é o único órgão que poderá manter o princípio da Separação Constitucional Igreja-Estado, resguardando a Laicidade do Estado brasileiro conquistado na Constituição Republicana de 1891.
Gilberto Garcia é Advogado, Pós-Graduado e Mestre em Direito. Professor Universitário, Conselheiro Estadual da OAB-RJ e Sócio Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros. Especialista em Direito Religioso e Autor dos Livros: “O Novo Código Civil e as Igrejas” e “O Direito Nosso de Cada Dia”, Editora Vida, e, “Novo Direito Associativo” e Co-Autor da Obra Coletiva: “Questões Controvertidas – Parte Geral do Código Civil”, Editora Método, e, ainda, do DVD – “Implicações Tributárias das Igrejas”, Editora CPAD. Site: www.direitonosso.com.br